A execução dos āsanam dentro do Hatha Yoga segue uma série de normas gerais para alcançar os objetivos da prática, o que também os distinguem de qualquer outra atividade. Assim, Antônio Blay, em seu livro Fundamento e Técnica do Hatha Yoga (pg.80, 8ªedição), ressalta que, para que a posição adotada realmente seja āsanam, deve apresentar uma série de características, sendo que as principais são: 1º Permanência progressivamente prolongada. 2º Extrema lentidão de execução. 3º Normalmente devem realizar-se de forma suave, evitando o esforço. 4º Absoluta necessidade de que a prática de cada āsanam esteja acompanhada simultaneamente dos seguintes fatores: respiração, relaxamento e atitude mental adequada. A permanência: A permanência é uma das principais características do ásana, pois, considerando que essas técnicas atuam na esfera física, energética e psíquica, é essencial que haja tempo hábil para que todas essas mudanças se desenvolvam adequadamente na prática, e de forma consciente. De acordo com esse fato, o autor afirma: “a maior parte dos ásanas são executados uma única vez, mas aumentando-se sua duração, à medida que se vai progredindo na prática, diversamente dos exercícios da ginástica ocidental, que são feitos sempre repetidas vezes.” Uma frase de grande sensibilidade que consideramos como um dos pontos altos do livro menciona que “no Yoga, cada ásana é um modo de estar para chegar a um modo de ser”. Para compreender essa afirmação com profundidade, só mesmo vivenciando a técnica. Para quem pratica faz todo o sentido, mas, para quem ainda não pratica, vou tentar explicar com a limitação das palavras: baseando-nos no Yoga Sútra de Pátañjali, ásana é uma posição firme e confortável, porém, a firmeza e o conforto não vêm de graça. O praticante é quem conquista esses elementos através do domínio do seu corpo, da sua energia vital. A firmeza decorre principalmente da concentração no corpo, e o conforto decorre principalmente do relaxamento na posição. Portanto, ao manter a concentração profunda no corpo, fazemos com que a consciência tome a forma do ásana, em outras palavras, fazemos com que ela se estabilize no corpo, que é o seu objeto de concentração no ásana.Conseqüentemente, tornamo-nos firmes, estáveis. Essas características desenvolvidas serão essenciais na meditação e se tornarão um comportamento permanente na vida. Ao mesmo tempo, ao exercer o relaxamento na posição, estamos progressivamente desfazendo as amarras psicofísicas, que constituem obstáculos para muitas ações na vida, inclusive para a meditação, permitindo, entre outras coisas, que a energia vital e os processos orgânicos fluam mais livremente e de forma harmônica. Dessa forma, naturalmente incorporamos essa atitude de descontração e fluidez no dia a dia. A extrema lentidão de execução: Segundo Antônio Blay “a extrema lentidão de execução é outra característica muito própria do Yoga”. E realmente, essa lentidão permite que o praticante se coloque no ásana de forma precisa, tomando consciência de cada momento e de cada detalhe importante como alinhamento, relaxamento ou contração dos músculos corretos, a variação mais adequada para o seu estágio de desenvolvimento, etc… para que obtenha o melhor proveito possível da posição final. Porém, de forma muito perspicaz, o autor nos lembra que “no princípio, o processo é quase inverso” , ou seja, o iniciante tenta “ir para a posição” de forma quase instantânea e automática, e uma vez na posição começa a tomar consciência do seu corpo e a despertar o estado mental próprio do ásana. Além desse fato é bom ressaltar que a execução lenta também favorece que se mantenha o estado de interiorização obtido no ásana anterior, sem permitir que a energia acumulada se disperse entre uma posição e outra e ainda levando a um encadeamento entre as técnicas. Execução suave e sem esforço: Para realizar os ásanas, não se utiliza o forçamento, mas sim a descontração e a consciência corporal. Essa regra também garante que cada praticante siga o seu próprio ritmo, mantendo a posição somente enquanto perceber que a permanência é construtiva. Com essa atitude, o praticante começa a aguçar a sua sensibilidade interna e o respeito pelo seu corpo, aprendendo a ouvi-lo cada vez melhor. Além disso há também uma razão energética para a suavidade, nas palavras de Antônio Blay: “O objetivo é o de criar e armazenar novas energias, evitando qualquer gasto energético inútil. E isto por duas razões: porque esta criação e poupança aumentam o poder e a resistência do organismo, e porque a acumulação de energia produz o despertar de diversos chakras, estimula uma circulação prânica melhor e favorece a tomada de consciência de novos estratos de nossa personalidade”. Respiração: Em relação à respiração, ela se torna mais profunda e regular como uma necessidade natural à medida que nos concentramos na posição, para que se exerça esse domínio da consciência sobre o corpo que deve ocorrer no ásana. A meta do Yoga é a expansão da consciência. A consciência é uma das formas de manifestação da energia vital. Para o ser humano, um meio importantíssimo para a captação de energia vital é justamente a respiração. Portanto, se ampliamos a respiração, atuamos diretamente na expansão da consciência. Sabe-se que os processos corporais dependem dos fluxos de energia vital dentro do organismo (pránas e sub-pránas), e um dos principais meios para a captação da energia vital é a respiração. Portanto, se a respiração é irregular, arrítmica, os processos orgânicos tendem a seguir o mesmo padrão. Ao contrário, se tornamos a respiração regular, impomos ritmo e ordem ao processo de captação e expansão de energia vital dentro do organismo, consequentemente, impomos ritmo e ordem aos processos corporais, produzindo maior harmonia, saúde, consciência e domínio da energia. Relaxamento: Muito importante é o relaxamento no ásana na permanência. Ao longo da nossa vida, várias emoções e outros conteúdos psíquicos são somatizados em nosso corpo de diversos modos, como por exemplo na forma de tensões. Muitas vezes, essas tensões são mantidas de forma inconsciente e permanente, até mesmo quando dormimos. Para que essas tensões se mantenham ocorre um gasto de energia, e se a tensão é desnecessária, esse gasto energético também é desnecessário. Ao praticar os ásanas, temos a oportunidade de tornar essas tensões conscientes para então desfazê-las através do relaxamento. Com isso, liberamos a energia que seria necessária para mantê-las, e essa energia se soma ao nosso patrimônio energético pessoal, traduzindo-se em mais vitalidade, realizando também uma verdadeira limpeza no psiquismo, dissolvendo aqueles conteúdos que mantinham tais obstruções. Além disso, observando essa regra, vamos relaxando cada vez mais as partes do corpo que não intervém no ásana, direcionando a energia de forma mais específica e suficiente para o local que realmente está sendo acionado. Atitude mental adequada: A atitude mental é esse estado de interiorização obtido e a consciência de todas essas ações internas que foram descritas. É o que mantém o sentido do trabalho realizado, é a percepção do momento presente da vivência e do Yoga em ação, como meio e fim. Veja no último parágrafo da pg.82 do livro Fundamento e Técnica do Hatha Yoga, de Antônio Blay, 8ª edição: “Não esperamos que o estudante possa, desde o começo, seguir, nem sequer compreender bem todos esses conceitos e normas de execução. Não obstante, julgamos conveniente expô-los porque cremos que o leitor ocidental precisa compreender, ou pelo menos, vislumbrar até onde leva o caminho que percorre; ainda que, por enquanto, esteja ele em seu começo. À medida que vai praticando, aplicando com critério e perseverança tudo quanto possa compreender, todas essas normas irão deixando de parecer-lhe meras palavras ou idéias. À medida que as aplique, irá vivendo-as e, ao vivê-las, conscientemente, compreendendo-as no seu verdadeiro sentido. Uma experiência cada vez mais clara e um discernimento progressivo mais profundo substituirão as idéias e teorias mais ou menos ocas e superficiais. E serão esta experiência e este discernimento os únicos que lhe poderão demonstrar e explicar claramente o caminho que conduz ao seu interior, assim como o próprio conteúdo desse interior”.
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